birra, 2025

birra, 2025, 22×19,5cm, grafite preta e aguarela s/papel

 

birra, 2025, 5(9,3×7,4cm), esferográfica s/papel escrito dos dois lados

 

estou farta!
— que ele não me ligue meia;
— de não ser correspondida no amor;
— de viver sozinha;
— de estar sozinha;
— de frio;
— de não ter dinheiro;
— de estar aqui;
— de não ter coisas grandes para pintar;
— que chova cá dentro;
— de ter frio;
— do atelier gelado;
— de estar à espera;
— de escrever cartas de fã ridículas;
— de estar apaixonada em vão;
— de desperdiçar tempo;
— de não estar com ele;
— de não estar com ele quando ouço vejo vivo coisas boas e belas;
— de fazer coisas sozinha;
— de pensar nele só;
— de desperdiçar;
— de o abraçar em pensamento;
— de não ver o mar;
— de não passear com ele;
— de não ir almoçar fora com ele;
— de viver assim;
— de não estar cá a fazer nada;
— do mesmo;
— do desconforto;
— da incerteza;
— de adiar prazeres;
— de não ter dinheiro;
— de não viver;
— de nada acontecer;
— de não fazer festas em animais;
— de dias sem sol;
— de ter medo quando chove muito: onde é que vai então começar a pingar de novo;
— do cão em loop ∞;
— de não ter telas grandes e papéis grandes;
— do monte de coisas feitas a apodrecerem;
— que as coisas não fluam;
— de ter frio;
— de não lhe contar o que fiz li vi ouvi aprendi hoje;
— de não ter vida a dois;
— de não fazer coisas com ele;
— de não ser desejada por ele;
— de não ser querida por ele;
— de não ser sua;
— de imaginar;
— de aguentar;
— de não viver à beira-mar numa casa boa com piscina e jardim e dois cães*;
— de ser ridícula!
— de ser completamente ridícula [risos!]
— de relativizar;
— de ter pena de mim própria;
— de não ganhar dinheiro;
— de não gastar dinheiro (porque contas)
— de não ir ver coisas com ele;
— de ser rica em tempo que sinto que apenas mato;
— de:
valha-me a RDP África (com ‘D’ de Rádio) [+risos!]
de madrugada a ouvir programas maravilhosos na RDP África, 101.5fm. Obrigada Carlos Pedro!
numa madrugada de uma fase parada da vida
— de ser ridícula a encantar-me com o galanteio dos pombos e a desejá-lo para mim;
— farta de não conseguir transmitir a beleza que vejo porque rapidez, trincha e rompante não rimam com delicadeza;
— de ouvir gaivotas e não estar à beira-mar;
— de só ver animais em imagens;
— de ver pares de namorados e casais e nunca mais chegar a minha vez;
[as músicas são agora de um cantor romântico brasileiro do séc.XX desconhecido cheio de desamor]
— de não ser mimada por ele;
— de não ter dinheiro;
— de ter frio;
— de não estar com ele;
— de estar triste;
— estou farta de ver toda a gente a emparelhar e nunca mais chegar a minha vez;
— de ter frio na cama quando me viro e entra ar gelado que gela os ombros e o pescoço e o princípio das costas; e de sentir a cara gelada e as orelhas; do ar gelado que entra quando me viro na cama e que gela o pescoço e os ombros e as costas que depois demoram a aquecer de novo; a sonhar com um enorme saco de água quente a envolver-me;
— de só me saírem coisas pueris no trabalho;
— de não ficar feliz com o que faço porque sai o que sai e não o que quereria (porque não consigo) porque é assim;
— farta de estar sem ele;
— de wish you were here;
— de wishful thinking;
— de só me apetecer estar com ele e de só me apetecer fazer coisas com ele;

— desta lucidez, quero magia

APETECE-ME FUGIR!

 

*acrescento dois burros

 

“On s’en fout de ce que je dis, vraiment, je ne suis pas dupe, ne vous inquiétez pas, je suis comme vous, moi aussi, je me regarde, c’est grotesque.”

Vincent Lindon

 

“c’est devenu une corvée, quoi, une espèce de tristesse qui dure”

 

“Artists: Yes you are crazy. You are weird. Just keep doing what you’re doing.”
Jerry Saltz

“Artists: Art is essentialy groping, play, desperation, obsession and blind faith.”
Jerry Saltz

 

 

ouvido depois:

“The same demons that speak to you and you and you at 3.15 in the morning, when you wake up and you go: “my work is no good, I’m a huge failure, I’m faking everybody out, I don’t know what I’m doing, I didn’t go to school, I don’t know how to schmooze, I don’t have enough money, I don’t really know the right people, I have a bad neck”, you know, “I don’t have hair, I don’t have money”, oh, I said that again! All of you, I beg you: be brave, have courage, you can…, don’t listen to the demons, they don’t know what they’re talking about. And to free you up even more, I was talking to somebody in the room about this, I would like to say to all of you that how ever scary making art or whatever you’re doing is, first of all, nobody knows what they’re doing, nobody, from the premier down, nobody knows what they are doing but they have a general idea how to do it. If you knew what you were doing, if you were Rembrandt, well, you would only have one painting – boom, ah! (I’m sorry, I have to give it back to this best, excuse me). If you were Rembrandt – that was a bad example – if you were an artist and you made a good painting and you knew what you did, you would do it everytime. But everytime you do something, it is different and seems impossible. Your job is to beat your head against the wall. You are a half mad smelly shaman. If you are an artist or an art lover, you live at the edge of the global village, what you do has no use to the real world; and yet our lives are totally invested in it.”
Jerry Saltz, 2025